Weverton Rocha ainda consegue aprovar emenda que garante na Constituição
políticas de ressocialização.
Pedro Ladeira/Folhapress/
Grupo protesta em Brasília contra proposta que reduz maioridade penal; comissão da Câmara aprova redução em caso de crimes violentos
RANIER
BRAGON
FOLHA DE SÃO PAULO.
Debaixo de muita polêmica e com
uma troca de sala de última hora para escapar de manifestantes, a comissão
especial da Câmara dos Deputados aprovou na noite desta quarta-feira (17) o
projeto que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos, no caso de crimes
violentos.
Em uma sessão de quase cinco
horas, fortemente protegida pela Polícia Legislativa e com acesso permitido
apenas a deputados, assessores e imprensa, a comissão aprovou o relatório por
21 votos a 6.
Só PT, PC do B e PDT ficaram
contra.
O texto é assinado pelo
deputado Laerte Bessa (PR-DF), o relator da comissão, mas seu conteúdo final
tem como reais patrocinadores o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ),
e a bancada do PSDB, especialmente os deputados Carlos Sampaio (SP) e Jutahy
Júnior (BA).
Cunha e tucanos fecharam acordo
para derrotar o PT e o governo Dilma Rousseff, que são contra a redução da
maioridade penal no país.
Com a aprovação na comissão,
que era dominada pelas bancadas da bala e religiosa, o texto segue agora para
votação no plenário da Câmara, provavelmente no próximo dia 30. Para ser
aprovado, é preciso o apoio de pelo menos 60% dos deputados (308 de 513). Caso
isso ocorra, segue para análise do Senado.
O texto aprovado tem o objetivo
de alterar a Constituição para reduzir a maioridade penal de 18 para 16 anos
para os seguintes crimes: hediondos (como estupro, latrocínio, falsificação de
medicamentos e prostituição de crianças e adolescentes) ou equiparados (tráfico
de drogas, tortura e terrorismo), homicídio doloso (quando há intenção de
matar), roubo qualificado (quando há uso de arma de fogo ou quando é praticado
por duas ou mais pessoas, entre outros pontos), lesão corporal grave e lesão
corporal seguida de morte.
O projeto que serviu de base
para o acordo, do senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), estabelecia que
caberia ao Ministério Público avaliar, em cada situação e a depender do crime,
se o jovem de 16 e 17 anos é passível de ser julgado como adulto (Código Penal)
ou continuar sob o Estatuto da Criança e do Adolescente, cuja pena máxima é de
três anos de internação.
Entretanto, conforme já havia
sido acordado entre Cunha e os tucanos, a redução da maioridade será automática
para crimes violentos, sem que haja necessidade de concordância do Ministério
Público. Ou seja, caberá aos promotores denunciar ou arquivar o caso de jovens
que cometam esses crimes com base no Código Penal.
O texto aprovado determina
ainda que os jovens de 16 e 17 anos cumpram pena em unidades distintas das dos
presos adultos e também das dos adolescentes infratores menores de 16 anos.
União e Estados ficarão responsáveis em construir esses estabelecimentos. Não
há, porém, prazo nem regras para que isso ocorra, nem consequências para
eventual descumprimento.
Não haverá, como Cunha havia
sugerido, necessidade de que as mudanças sejam aprovadas pela população em
referendo. Após aliados se colocarem contra, o presidente da Câmara desistiu da
ideia.
A comissão aprovou ainda uma
emenda do deputado Weverton Rocha (PDT-MA) que inclui na Constituição a determinação
genérica de que o Estado instituirá políticas públicas de ressocialização de
adolescentes, com a destinação de recursos específicos que não poderão ser
congelados.
A aprovação da redução da
maioridade penal foi criticada por Daniel Wilkinson, diretor para as Américas
da ONG Human Rights Watch. Para ele, caso o projeto seja aprovado nas próximas
instâncias, será “um grande retrocesso para a proteção dos direitos das
crianças”, que deve colocar em risco os esforços para diminuição da
criminalidade.
“Nos Estados Unidos, um dos
poucos países que trata adolescentes como adultos, vários estudos têm mostrado
que processar e julgar adolescentes como adultos só aumenta as chances de
cometerem novos crimes”, completou Wilkinson, em nota divulgada.
LASCA
“Um homem de 16 anos é capaz de
entender o que é certo e o que é errado. Quero dizer para vocês que nesse
século 21 não podemos dizer que um menor de 16 anos é inimputável, isso é
absurdo”, discursou Laerte Bessa, acrescentando: “Minha convicção não é baixar
de 18 para 16 anos só, eu queria pegar mais, queria pegar mais uma lasca desses
bandidos que muita gente quer proteger porque nunca esteve na rua para
enfrentar bandidos e delinquentes dessa natureza.”
O deputado-relator, que fez
carreira como delegado da Polícia Civil, citou principalmente o caso da
participação de menores de 18 anos no estupro coletivo de um grupo de
adolescentes no Piauí. Uma delas acabou morrendo. O caso também foi citado por
outros parlamentares favoráveis à redução.
“A meu ver o que estamos
fazendo é um agravamento do problema. Nos países em que houve essa redução da
maioridade penal, no momento estamos vivendo uma inversão porque não se obteve
uma redução da criminalidade, ao contrário”, discursou a deputada Margarida
Salomão (PT-MG).
“Se vocês estão querendo
atender ao discurso dos locutores de rádio, o discurso de delegados,
lembrem-se: Jesus Cristo foi crucificado devido ao clamor das ruas. Se vocês
estão com tanto medo da rua, lembrem-se: daqui a quatro anos vai continuar tudo
a mesma coisa, vocês estão vendendo à população algo que vocês não vão
entregar”, reforçou o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS). Ele é dissidente em
sua bancada nesse tema.
Petistas e governo tentaram
barrar a medida declarando apoio às propostas dos tucanos Geraldo Alckmin (SP)
e José Serra (SP) de elevação do tempo máximo de internação dos menores
infratores. Mas os deputados do PSDB preferiram fechar um acordo com Cunha em
prol da redução.
Contrários à redução argumentam
que a medida será considerada inconstitucional por, entre outros pontos, mexer
em trechos da Carta Magna que não podem ser alvo de emenda.
Os partidos de esquerda
reclamaram ainda que Cunha paralisou as votações em plenário na tarde e início
da noite desta quarta para permitir a aprovação do relatório. Pelas regras da
Câmara, a abertura das votações no plenário encerraria automaticamente todos os
trabalhados das comissões.
PROTESTOS
Despistados com a troca de sala
feita de última hora e barrados pela Polícia Legislativa, os manifestantes
ficaram no lado de fora da sala, mas fizeram algum barulho durante a sessão. Do
lado de dentro era possível ouvir apitos e gritos de “fascistas”.
Os protestos foram organizados
principalmente por estudantes da UNE e da Ubes, as entidades representativas de
estudantes universitários e do ensino médio, respectivamente. Levada por
parlamentares de esquerda, as presidente da Une, Carina Vitral, e da Ubes,
Bárbara Melo, conseguiram entrar.
Na sessão da semana anterior,
bate-boca entre os estudantes e deputados da bancada da bala acabou em
confronto, com o uso de spray de pimenta dentro da sala em que era realizado o encontro.
Após a aprovação, deputados da
bancada da bala saíram da sessão entoando em coro o bordão “eu sou brasileiros,
com muito orgulho, com muito amor”. Com ajuda da polícia, eles passaram pelos
manifestantes e entraram no plenário da Câmara no momento em que Eduardo Cunha
abria a sessão do dia. O protesto continuou por alguns momentos, sob o olhar do
presidente da Casa.