Por: Blog do Foguinho, 19 de novembro de 2013.
A cassação do mandato do prefeito Rafael de
Burití foi gerado de muita polêmica e detalhes que resultaram na
queda do prefeito e vice-prefeito do município.
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL
ELEITORAL N° 168.2013.6.10.0025 - CLASSE AIJE - PROCEDÊNCIA: 25ª ZONA
ELEITORAL - BURITI.
Investigante: Coligação "Buriti para todos nós"
Advogados: Dr. Rodrigo Pires Ferreira Lago, OAB/MA 6148 e Dr. Valdênio
Nogueira Caminha, OAB/MA 5835.
Investigados: Rafael Mesquita Brasil e Raimundo Nonato Mendes Cardoso
Advogados: Dr. Willamy Alves dos Santos, OAB/MA 12082-A e OAB/PI-2011; Dr.
Ciro Rafael Caldas Oliveira, OAB/MA 7725, Dr. Benevenuto Serejo, OAB/MA 4022
e Dr. Ormanne Fortes Menezes Caldas, OAB/MA 11287.
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Rafael Mesquita e seu vice, Raimundo Camilo |
SENTENÇA
Vistos etc.
A coligação "BURITI PARA TODOS NÓS" maneja a fluente representação
em desfavor de Rafael Mesquita Brasil e Raimundo Nonato Mendes Cardoso
sustentando, em síntese do essencial, que os representados devem ser cassados
pela prática de ações ilícitas consistentes no que se convencionou chamar
"caixa dois" (desvio de dinheiro, não contabilizado).
Aduz a coligação representante que os representados foram exitosos nas
eleições de 2012 aos cargos de prefeito e vice-prefeito, respectivamente.
Todavia, ao cotejar as prestações de contas da sua coligação e dos
representados notou disparidade de números, o que a induziu a pensar se
tratar de "caixa dois" , de modo a impedir que fossem os recursos
examinados corretamente.
Prossegue pontuando cada fato, começando da omissão de despesa de campanha do
ultraleve e dos panfletos que foram lançados desta aeronave, de prefixo PT-PSJ,
com uma pesquisa eleitoral que antecipava a vitória dos representados; ou
seja, este gasto não foi contabilizado, apesar de constar a contratação na
gráfica onde foram impressos os panfletos. Afirma ainda, neste particular,
que a pesquisa teve a intenção de desigualar a eleição, já que anunciou
números irreais.
O segundo ponto de omissão indicado pela representante foi a ausência de
despesa com os ônibus. E aqui a afirmação da representante ganha maior
envergadura porque indica que foram utilizados ônibus escolares, de placas
AEK-8605 e NXJ-8142, para o transporte de pessoas com a finalidade de
participar de evento político-eleitoral, o que é vedado por integrar o acervo
patrimonial do Poder Público. Ainda assim, assevera que tais gastos não foram
contabilizados em conta específica e são oriundos de fonte ilícita, já que
cedidos pelo Poder Público.
O terceiro argumento içado pela representante diz respeito à doação estimável
em dinheiro da Empresa Síntese - Sociedade Industrial e Técnica de Serviços de
Engenharia Ltda., concernente à cessão de vários veículos alugados da empresa
Crisbell Locadora de Veículos, Turismo e Serviços Ltda., e que segundo alega
serve para encobrir o "caixa dois" da campanha, porquanto não
transitaram pela conta-corrente.
Ainda em relação a estes supostos aluguéis, sustenta ser absurda a
ilegalidade da doação, máxime por restar claro que os recibos foram
produzidos com data retroativa à campanha, sem a prévia emissão de recibos
eleitorais. Ademais, os bens locados não pertencem ao acervo patrimonial da
empresa doadora.
Fiando-se em dispositivos legais, requer seja julgada procedente a ação para
o fim de cassar os diplomas dos representados.
Devidamente notificados, os representados apresentaram, em peça única,
contestação refutando topicamente as assertivas da coligação
representante.
Consoante seu entendimento, não houve contratação dos serviços do
proprietário do ultraleve, nem mesmo dos panfletos que foram jogados de forma
espontânea na cidade de Buriti/MA, após adquiri-los no comitê político dos
representados.
Em relação aos ônibus escolares, assevera que em nenhum momento estes
veículos foram utilizados em campanha ou carreata.
A defesa ainda argumenta que o importe desembolsado pela empresa Síntese à
locadora de veículos Crisbell foi utilizado e que o recibo datado de 05 de
outubro de 2012 diz respeito a todo o período de campanha, e não somente ao
período assinalado pela representante. Aduz também que a empresa doadora
(Síntese), por sua conta, locou os veículos da empresa Locauto.
Finaliza a peça contestatória arrimando-se em arestos de jurisprudência e
pugnando pela improcedência da ação.
Audiência de instrução e julgamento realizada no dia 05 de setembro de
2013.
Em seguida, a representante e os representados reiteram os termos da proemial
e da contestação, desta feita fortalecidos nos elementos de prova
colhidos.
O Ministério Público Eleitoral opinou pela cassação dos representados.
É o relatório.
Decido.
Inicialmente, registro que fui indagado, ao longo destes últimos 10 (dez)
dias, sobre a prolação desta sentença, que comecei a confeccionar no último
dia 1º de novembro de 2013, finalizando no dia 04 de novembro,
coincidentemente na data comemorativa do bicentenário do Tribunal de Justiça
do Estado do Maranhão. Após, trouxe a minuta para revisão, impressão e
assinatura.
Na tarde da quarta-feira (06.11.2013), recebi mensagem de Buriti anunciando
uma possível interrupção da rodovia estadual por conta do atraso desta
sentença, cujos autos vieram conclusos em 22 de outubro de 2013.
Sentença não é fruto de mera subsunção desprovida de análise - o que até
facilitaria o trabalho dos juízes. É, na verdade, um árduo trabalho de
analisar os fatos e provas e amoldá-los ao que prevê nossa legislação. Não é
trabalho que se extrai da cabeça de um julgador da noite para o dia,
notadamente quando este juiz possui mais de 3.000 (três mil) processos
fervilhando em sua cabeça.
Trabalho exaustivamente em uma Comarca (Chapadinha/MA) que possui a
distribuição cerca de 10 (dez) vezes maior que a de Buriti/MA. Só isso já
justificaria certa delonga, mas em nenhum momento utilizei este argumento.
Estou aqui para contribuir, mas parece que a sociedade interessada faz pouco
caso da ajuda. Absurdo!
Não questiono a pressa que os feitos eleitorais devam ter. Assevero, contudo,
que a maledicência de alguns, aliada a interesses mesquinhos de balbúrdia,
tencionando claramente desestabilizar a pacata comunidade de Buriti, cria um
clima de desrespeito e bagunça. Se acharem que agindo assim irão me
intimidar, estão enganados!
Os asseclas, em vez de reclamarem, deviam buscar ler os planos de governo,
eleger melhores representantes e não dependerem da estrutura do governo, que
não existe para ser pai de ninguém!
Estranhamente, o processo teve um retardo que não se iniciou em minhas mãos,
mas as pressões começaram a recair sobre minha condução dos feitos. Mais
estranho ainda é a ignorância daqueles que apontam o dedo, sem sequer se
atentar aos prazos processuais. É senhores, no nosso país existem leis
eleitorais que estabelecem prazos a serem respeitados!
A propósito, aqui lançando um juízo pessoal acerca da política brasileira,
independentemente de quem ocupar a cadeira de prefeito neste Município de
Buriti/MA, não cessará a contenda político-partidária. A questão é cultural!
O problema não está só nos políticos, está também em nosso povo! O mesmo povo
que se arregimenta para defender os interesses de seu candidato é o mesmo
vende sua consciência, vende sua dignidade, enfim, vende sua própria escolha.
As eleições que presidi ou mesmo trabalhei como advogado ou à serviço da
Justiça Eleitoral me autorizam essa conclusão.
Infelizmente, vivemos em um país onde a população, em sua grande maioria, não
é politizada. Arrisco dizer que a massa social, é escravizada mental e
socialmente por políticas atrasadas, mascaradas de assistencialismo. Na atual
conjuntura, se um candidato à presidência disser que vai acabar com o
"bolsa-família" , por exemplo, este certamente será o maior derrotado
nas urnas. Este benefício, aliás, alcança pessoas que se aproveitam de
métodos sub-reptícios para utilizá-lo como fomentador de ócio, incentivador à
natalidade e, a longo prazo, gerando aumento da criminalidade pela falta de
compromisso de pais e da falência do sistema de governo.
Nos municípios maranhenses, com exceção das grandes cidades e da Capital, o
dinheiro que circula é oriundo exclusivamente da prefeitura. Quando um(a)
prefeito(a) atrasa a remuneração gera um verdadeiro caos no comércio; os
recursos não circulam. E quem presta concurso público vira príncipe, rendendo
homenagens apenas ao soberano, intitulado prefeito(a).
A oposição, que lembra os tempos da resistência armada, pouco esclarecida,
espera, de forma ensandecida, que o poder seja destinado ao seu escolhido.
Mas o que realmente deseja é ter a mesma vida de quem se guerreia.
Em muitos municípios maranhenses, a conclusão dos eleitores esclarecidos é
que as eleições municipais são verdadeiras guerras, porquanto representam a
chance de um grupo se firmar, ainda que por quatro anos, e usufruir das
benesses e tranquilizar um grupo que o apoiou nas eleições. Não é raro ouvir
nas ruas que um eleitor terá um cargo na prefeitura, caso seu candidato
vença.
Por isso, tenho a firme convicção de que aqueles que imaginam a derrocada de
um candidato são na verdade pessoas que tem o mesmo propósito de atingir os
objetivos outrora alcançados pelos seus opositores. No Maranhão, verdade seja
dita, alguns políticos criam em sua órbita corporal uma aura, uma figura
mítica, do qual não sobram eleitores, mas sim seguidores.
Utópico é algo que não existe, mas que não é impossível. É, no dizer do
pensador uruguaio Eduardo Galeano, um horizonte, em que quanto mais corremos
para alcançá-lo, mais ele se afasta. Desejo, honestamente, que nosso povo
seja mais educado, não só de valores e princípios - coisa que falta aos
muitos que insuflam os populares -, mas também tenha mais conhecimento e
educação. A intenção de tornar o Brasil uma Europa deve passar obrigatória pela
reforma do ensino, mas também agir e cobrar condutas éticas. É, como no mito
da criação do homem, de Platão, crer que o político tenha como base o aidos
(decoro, pudor) e o dike (justiça).
Vencida essa reflexão, volto ao cerne desta questão.
São quatro os processos que envolvem os representados, e o conjunto deles não
passa despercebido. Contudo, analiso o presente e sobre ele proferirei
sentença.
No tocante à omissão de descrição dos panfletos e da aeronave, tenho que os
representados confessaram seu erro no tocante à confecção de pesquisa. Ora,
além de recolher a pesquisa no próprio comitê político, o eleitor/piloto se
dispôs a perpetrar ato que incute na mente do eleitor que o resultado já
estaria sacramentado.
Porém, vejo que a contestação reporta-se ao fato de que o dono do ultraleve,
Sr. José Edmar Araújo Sousa, recolheu os panfletos no comitê político dos
representados; porém, a Gráfica Editora Escolar (fl. 178) informa que os
panfletos foram pegos pelo Sr. José Edmar. Se por um lado, os representados
não informaram em suas contas os panfletos, por outro revela a inverdade no
recolhimento dos mesmos informes.
O certo é que os representados - e aqui emprego presunção de veracidade às
palavras dos seus cultos advogados - entregaram ao testigo José Edmar Araújo
Sousa no comitê os panfletos com a pesquisa. As menções feitas a José Edmar
dão conta de que o mesmo vendeu aos representados combustíveis e
lubrificantes (tipo de despesa), mas nada relacionado aos trabalhos
gráficos.
A conclusão a que chego é de que realmente a despesa foi feita sem que fosse
declinada na prestação de contas. E mais, não obstante ter sido feita à
margem da devida informação contábil à Justiça Eleitoral, teve intenção clara
de desequilibrar o pleito eleitoral, já que divulgou números incoerentes com
o resultado das urnas.
Estranhamente, quiçá por erro, consta que o mesmo instituto que realizou a
pesquisa realizou doação ao candidato Rafael no valor de R$ 6.000,00 (seis
mil reais) (fl. 29).
Em realidade, é ilógico pensar que não houve prévio acerto entre os
representados e o Sr. José Edmar ou mesmo que o fez por mera liberalidade,
uma vez que os panfletos foram pegos no comitê eleitoral dos representados.
E, se foram pegos no comitê, deveriam os materiais ser contabilizados, o que
não foi.
De tudo, pois, tiveram ciência. E isso ganha relevo quando se observa que o
panfleto traz, em letras bem pequenas, que a coligação dos representados,
"BURITI NÃO PODE PARAR" (CNPJ: 16.170.338/0001-21 / CPNJ:
35.189.000/0001-66), foi quem contratou a quantidade de expedição de 5.000
cópias. Em contrapartida, a Gráfica Editora Escolar disse que a quantidade
foi retirada por José Edmar.
Impende ainda destacar que a ação de José Edmar em literalmente jogar
panfletos ao público perpassa a ciência dos representados e de seu comitê
político, aqui considerando que sabiam que José Edmar recolheu o material na
agremiação partidária e que fatalmente seria utilizado.
O último raciocínio que faço acerca desta controvérsia é que ainda que o trabalho
tenha sido espontâneo, o fez com o intuito de atingir uma grande massa. Se o
desiderato foi atingido, tal disposição importa em doação de trabalho, mas o
trabalho gráfico deveria ser contabilizado.
Durante a audiência de instrução, ao juiz é dada a possibilidade de sentir
das testemunhas se estão ou não falando a verdade, se vieram predispostas a
criar determinada ficção ou mesmo, como frequentemente ocorre, tentar
beneficiar a parte que buscam ajudar. De toda sorte, é um bom momento para
que o juiz fique atento a pormenores que importarão no valor que o magistrado
dará a cada depoimento.
Digo isto porque me pareceu que o Sr. José Edmar tentou engendrar uma
narrativa, formando-a de forma que condissesse com a realidade que entendia
normal. Todavia, ao ser questionado sobre a livre iniciativa de distribuir os
panfletos em seu ultraleve, chocou-se com o que foi sustentado pelos
advogados dos representados. Disse a testemunha que mandou fazer os panfletos
e os jogou, enquanto que a defesa fiou-se de que ela pegou os panfletos no
comitê e os ventilou por cima da cidade.
Quando indagado sobre este pormenor e outros o Sr. José Edmar caiu em algumas
contradições e que terminaram por descurar a verdade que pretendeu formar. Os
panfletos foram, na verdade, confeccionados a pedido da coligação dos
representados, mas mesmo assim manteve sua versão de que comprara os
panfletos na gráfica em Chapadinha/MA.
Em arremate, além de gerar desequilíbrio com uma pesquisa irreal, os
panfletos não foram contabilizados como deviam.
Deixo de falar sobre o ultraleve no que diz toca ao "caixa dois" ,
à míngua de provas sobre tal fato.
No tocante à utilização de ônibus escolares, observo que realmente há
indícios de que a sua utilização era voltada à carreata dos então candidatos
Rafael Brasil e Raimundo Nonato, ora representados. Todavia, a conduta
destacada, e aqui examinada, é a ausência da indicação de despesas com
ônibus, seja integrando o patrimônio público ou não. Caso venha a ser
deflagrada ação pertinente ao uso indevido de bens do patrimônio público,
será analisado.
Deste modo, passarei à análise do terceiro ponto: locação terceirizada dos
ônibus da empresa Crisbell.
E o ponto nodal a ser destacado é se a Empresa Síntese poderia contratar em
favor dos representados com a empresa Crisbell; ou seja, se a legislação
eleitoral permitira a terceirização no processo de doação ou locação, sem que
os valores fizessem constar na contabilidade apresentada à Justiça
Eleitoral.
Calha aqui assinalar que a Resolução TSE n.º 23.376/2011, que dispõe sobre a
arrecadação e os gastos de recursos por partidos políticos, candidatos e
comitês financeiros e, ainda sobre as prestações de contas das eleições de
2012, prescreve, em seu art. 22, que "As doações, inclusive pela internet,
feitas por pessoas físicas e jurídicas em favor de candidato, comitê
financeiro e/ou partido político serão realizadas mediante: I - cheques
cruzados e nominais, transferência bancária, boleto de cobrança com registro,
cartão de crédito ou cartão de débito; II - depósitos em espécie, devidamente
identificados com o CPF/CNPJ do doador; e III - doação ou cessão temporária
de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro" .
Em relação aos bens estimáveis, o art. 23 da mesma resolução foi incisivo:
"São considerados bens estimáveis em dinheiro fornecidos pelo próprio
candidato apenas aqueles integrantes do seu patrimônio em período anterior ao
pedido de registro da candidatura." E arremata: "Parágrafo único.
Os bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro doados por pessoas físicas e
jurídicas, com exceção de partidos políticos, comitês financeiros e
candidatos, devem constituir produto de seu próprio serviço, de suas
atividades econômicas e, no caso dos bens permanentes, deverão integrar o
patrimônio do doador.
Neste particular, infiro que a empresa Síntese não poderia contratar com a
empresa Crisbell a locação dos veículos, terceirizando as negociações. E as
razões da lei me parecem óbvias: transparência e evitar o abuso do poderio
econômico e caixa doois. Se a empresa Síntese queria contribuir que
utilizasse bens integrados ao seu patrimônio e não de terceiros.
Apesar de ter apresentado dois recibos no valor de R$ 7.000,00 (sete mil
reais) cada, cuja nota fiscal foi emitida em 12 de setembro de 2013, quase um
ano depois de ter sido contratada a locação, os veículos não fazem parte do
patrimônio da empresa Síntese e nem fizeram parte na confecção dos recibos
eleitorais. É até estranho que os representados se valessem de uma terceira
pessoa (jurídica) para prestação de serviços, quando poderia fazer
diretamente com a empresa Crisbell.
Daí porque, entendo eu, que houve claro açoitamento da regra do art. 23 da
mencionada Resolução n.º 23.376/2011 - TSE, deixando claro, ao terceirizar as
relações negociais, que utilizou de subterfúgio para encobrir as contas a
serem prestadas. Agindo assim, por óbvio, os representados foram crassamente
beneficiados pela Empresa Síntese, que poderia valer-se de quaisquer valores
para favorecê-los, seja contratando bens e serviços de terceiros, como no
caso da locadora Crisbell, seja para figurar como ponto de apoio dos recursos
financeiros despendidos e não contabilizados.
Depois de verificar a data de expedição da nota fiscal, confesso que
desconfio da higidez da negociação e mesmo dos valores e recibos. É crível se
depreender que a nota fiscal deveria ser lançada na época da eleição; não o
fazendo, é fácil se asseverar que os valores poderiam ser norteados ao
alvedrio da empresa.
Os veículos da empresa Crisbell foram utilizados durante a campanha eleitoral
e transportaram os eleitores, não me fazendo crer que se trata de fato
isolado, mas sim de continuidade e que os valores postos nas notas e recibos
foram lançados em montante bem menor do que foram realizados os serviços.
Destaco que as condutas perpetradas pelos representados em não declinar a
confecção e panfletos com pesquisa, assim como a utilização de terceiros na
contratação de locação - o que deveria ser diretamente - terminam por também
vergastar a norma do art. 30 da Resolução n.º 23.376/2011 - TSE, que indica
tais condutas como sujeitas a registro e aos limites fixados. Ademais, não
constam os respectivos recibos eleitorais, exigidos pelo art. 33 da mesma
resolução pretoriana, e nem sua falta foi justificada (art. 34).
Nesta última hipótese, vê-se também que se infringiu o art. 31 da mesma
resolução, cuja dicção prega o seguinte: "Com a finalidade de apoiar
candidato de sua preferência, qualquer eleitor poderá realizar gastos totais
até o valor de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos),
não sujeitos à contabilização, desde que não reembolsados, hipótese em que o
documento fiscal deverá ser emitido em nome do eleitor (Lei nº 9.504/97, art.
27)" . Ainda que se considerasse que foi a Crisbell quem doou, suas
doações ultrapassaram bem mais que o limite previsto. Em qualquer dos casos,
não vejo apego à licitude.
Quanto ao fato levantado pela representante de que foi citada a empresa
Locauto, não vejo sentido em considerá-la porquanto a ilegalidade surgiu
independente de ser a empresa Locauto ou a empresa Crisbell.
Por tudo que vi destes autos, o substrato probatório me autoriza reconhecer o
"caixa dois" na campanha do candidato, e acredito que todas as
condutas reprováveis de esconder da Justiça Eleitoral poderiam ser remediadas
se realmente os representados agissem em compasso com a lei. De fato, os
representados deveriam registrar a confecção de panfletos e aluguel de
veículos (não pertencentes ao patrimônio público) de forma legal, mas não o
fizeram. E pior, agindo assim eles abriram um caminho pra se presumir que
outras irregularidades foram cometidas e não consignadas contabilmente.
Independentemente de importar ao processo, a verificação das irregularidades
aqui apontadas, no meu sentir, geram desigualdade entre os candidatos na
primeira hipótese (milheiros de panfletos jogados pelo ultraleve) e
ilegitimidade do processo eleitoral no segundo momento (locação
terceirizada).
Por oportuno, a despeito da razoabilidade ou da proporcionalidade, invocadas
pelos representados, creio que não devam ser interpretadas em seu favor.
Primeiro pelo simples fato de que as faltas cometidas não se limitam apenas
aos valores indicados em supostas notas ou recibos, não podendo sequer se
apurar valores, a não ser os que são postos ao alvedrio de quem os
confecciona; a duas porque errado por pouco ou por muito é errado de qualquer
jeito; a três porquanto a interpretação dada pelos tribunais não é a de
aceitar pequenas falhas, corrigíveis, mas sim de reprovar a prática de
ilegalidades. Se fossem pequenas falhas (irregularidade formal), até
alcançaria o mesmo raciocínio dos representados, mas não é o caso; são, sim,
falhas graves de caixa dois, inaceitável do ponto de vista legal e
ético.
Finalmente, assento que não estou a discutir prestação de contas, mas sim
condutas ilegais e indevidas ao longo do processo eleitoral. E neste passo
entendo que restou comprovada a ilicitude dos gastos.
Do exposto, julgo procedente o pedido encartado na proemial para reconhecer a
utilização indevida de recursos não contabilizados na prestação de contas dos
candidatos eleitos Rafael Mesquita Brasil e Raimundo Nonato Mendes Cardoso,
cassando, por consequência, os seus diplomas, assim o fazendo com supedâneo
legal no art. 30-A da Lei n.º 9.504/97 c/c o art. 22 da Lei Complementar n.º
22/90, declarando-os ainda inelegíveis pelo prazo de 08 (oito) anos
subsequentes à eleição de 2012.
Considerando o disposto no art. 257 do Código Eleitoral, que apregoa a
inexistência de efeito suspensivo aos recursos eleitorais, esta sentença tem
efeito imediato, razão pela qual determino a diplomação do segundo colocado
nas eleições de 2012, Lourinaldo Batista da Silva e seu respectivo
vice.
Por cautela, determino que seja oficiado aos Bancos, onde o Município possua
conta, para que fiquem suspensos quaisquer movimentações financeiras até que
sobrevenha a diplomação e posse de novo gestor, ressalvando-se o normal
pagamento dos servidores públicos municipais, que deverão atender a folha de
pagamento do mês anterior, garantindo-se assim que suas remunerações não
serão atingidas pela alternância. Para o devido cumprimento, a instituição
financeira deverá apresentar planilha com o pagamento do mês anterior e do
que virá na constância deste decisum.
Em relação à testemunha José Edmar Araújo Sousa, determino o encaminhamento
de cópia dos fluentes autos à Delegacia de Polícia para apurar crime de falso
testemunho, assim como da Gráfica Editora Escolar para apuração de sua
responsabilidade pela emissão de documento supostamente falso.
Determino que o chefe do Cartório Eleitoral certifique se houve desobediência
de alguma das empresas oficiadas. Em caso positivo, de igual modo, envie-se
cópia para deflagração de inquérito policial para apuração de crime de
desobediência.
Determino ainda a abertura de inquérito policial para a apuração da conduta
de quem vem fomentando irresponsavelmente e insuflando a população a atos de
vandalismo e baderna, tais como o bloqueio de rodovias e invasão ao Fórum.
Faça-se acompanhar a matéria do blog "correio buritiense" referente
à postagem "Indignados com corrupção e lentidão da justiça" , no
qual, segundo informações, agremiados políticos ou simpatizantes do grupo
adversário, que ora figura como apoio da coligação representante, estão se
arregimentando para desestabilizar a ordem local.
Sem prejuízo, na análise dos demais processos outros nomes despontaram como
sujeitos à análise de suas condutas, de modo que deverão ser incluídos ao
longo da investigação policial para se verificar quem são os que planejam
causar instabilidade no Município.
Remeta-se cópia dos presentes autos ao Representante do Ministério Público
Eleitoral para apuração de crimes eleitorais por parte dos investigados.
P. R. I. C.
Após o transito em julgado, arquivem-se com as cautelas legais.
Buriti(Ma), 14 de novembro de 2013.
Mário Henrique Mesquita Reis
- Juiz da 25ª Zona Eleitoral, respondendo - |